Foi durante o século 12, porém, que se difundiu mais rapidamente a idéia do sabá, reunião noturna das sextas-feiras, à qual as bruxas compareciam voando em suas vassouras, cavalgando seus bodes, ou mesmo transformadas sob a forma de pássaros. Para que pudessem voar, as feiticeiras untavam o corpo com uma poção mágica por elas preparada; e na cerimônia, iniciada à meia-noite, entregavam-se a orgias e ao Demônio.
Somente em 1250 é que alguns bispos entregaram ao dominicano Étienne de Bourbon a primeira descrição do sabá. Oito anos depois iniciam-se os processos por feitiçaria, e só no ano de 1275, após várias condenações, uma primeira acusada é morta na fogueira. O próprio São Tomás de Aquino (1225-1274), expoente da escolástica, declarou ser possível a união carnal com Satanás. “Tudo o que acontece por via natural, o diabo pode imitar!”, afirmou.
Em 1318, o bispo de Cahors foi condenado à fogueira sob acusação de haver tramado magicamente contra o papa João XXII, por encantamento com boneco de cera, do qual a história tem relatos semelhantes desde 2500 a.C. O poeta Virgílio (70-19 a.C.) também fez referência à mesma prática. Em 1398 foi a vez da Universidade de Paris reforçar a tese da união sexual entre as bruxas e o Demônio, e em 1424 o monge Bernardino de Siena (1380-1444) pregou contra as artes mágicas em Roma. Em 1465, foi condenado à fogueira o prior da Ordem dos Servitas, dono de um bordel, acusado de oferecer súcubos (demô-nios sob a forma feminina) aos que visitavam sua casa de prazeres.
Até esse momento, no entanto, os processos só eventualmente levavam à pena capital. Embora houvesse campanhas da Igreja contra hereges e pagãos, nenhuma caça sistematizada às bruxas existia. Tanto é que, em 1474, os carmelitas, de seu púlpito, arriscavam-se a prever o futuro durante as missas, e o diziam fazer com auxílio dos demô- nios. Só com a reiterada insistência de dominicanos alemães é que o papa Inocêncio VIII, em 5 de dezembro de 1484, publicou a bula Summis Desiderantes Affectibus (“Desejando com Suma Ansiedade”), que espalharia o terror pelo continente:
“…tem chegado recentemente a nossos ouvidos que, em certas regiões da Alemanha setentrional [...] nas dioceses de Mainz, Colônia, Trier, Salzburgo e Brêmen, muitas pessoas de ambos os sexos, esquecendo-se de sua própria salvação e apartando-se da fé católica, têm mantido relações com os demônios [...] por meio de encantamentos, feitiços, conjuros e outras superstições malditas…”
“O ‘Malleus’, código atroz contra as artes negras de magia, abriu as portas para o rolo compressor da santa histeria em que se transformou a Inquisição.”
Confirmada pelo imperador Maximiliano I, o papa designou para executar a bula, a começar pelo país reclamante, os monges Heinrich Institor e Jacob Sprengher. Este último, deão da Universidade de Colônia, publicaria dali a dois anos, com Heinrich Kramer, prior de Salzburgo, a mais importante obra sobre demonologia da história, o temível Malleus Malleficarum (“O Martelo das Bruxas”), fonte de inspiração para todos os tratados posteriores.
O “Malleus”, código atroz contra as artes negras de magia, mais do que a bula papal, peremptoriamente abriu as portas para o rolo compressor da santa histeria em que se transformou a Inquisição. Sua intenção era pôr em prática a ordem do Êxodo, 22;17: “A feiticeira, não a deixarás com vida.”
O Martelo das Bruxas dividia-se em três partes. A primeira ensinava aos juízes a reconhecer as bruxas em seus múltiplos disfarces e atitudes. A segunda expunha todos os tipos de malefí-cios, classificando-os e explicando-os. A terceira regrava as formalidades para agir “legalmente” contra as bruxas, demonstrando como inquiri-las para sempre condená-las.
O processo era cruel. Levava-se ao tribunal qualquer um que fosse suspeito de feitiçaria. Bastavam três testemunhas para que juntas servissem como “prova” dos autos. Os filhos podiam entregar seus pais; os cônjuges podiam delatar-se mutuamente. Por meio de tortura obtinham-se as confissões. Os réus eram ainda submetidos às provas ordálicas; nestas, qualquer mancha escura na pele do acusado serviria como prova do pacto com o Demônio. A insensibilidade à dor em qualquer parte do corpo também era indício de feitiçaria; ademais, os suspeitos eram amarrados em cruz sobre madeiras e atirados em algum rio. Se o acusado não afundasse, estava aí a prova de que o Diabo o protegia, razão pela qual era entregue à fogueira; caso se afogasse, estaria antecipada a justiça divina.
Extraíam-se assim as mais absurdas confissões, incluindo transformações dos envolvidos em cisnes negros, gatos ou lobos; também suas sevícias trocadas com Satanás.
Retirado do site Planeta na Web
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